Eu já nem lembrava como foram difíceis os primeiros dias na Covilhã. Eu já não lembrava dos dias em que chorei de saudade porque agora só tenho olhos pra chorar essa saudade nova, que brotou tão rápido e que encontrou, no solo desse amor pela cidade, um terreno fértil. Dezenas de microfilmes passam pela minha cabeça, e eu só consigo pensar que eu curti cada segundo de estar lá, que eu gostava de estar no alto e ver a cidade aos meus pés; gostava de me agasalhar do frio e de reclamar dele, para depois ir dormir tão quentinha na minha cama. E acordar feliz porque tinha dormido bem, porque eu tinha aulas, e mesmo que não fossem as melhores do mundo, eram as minhas, e sempre me davam algo sobre o que pensar.
Eu almoçava na cantina, tomava um café e ia para a biblioteca. Depois voltava pra casa, cansada… fazia comida, fumava um cigarro, escrevia, lia. Adormecia. Vinha para Lisboa louca de saudades do meu bem, mas já depois de uns dias, enlouquecida pelo caos, só desejava voltar pra minha Covilhã, tão cheirosa, tão calma, tão sossegada, tão cheia de amigos e amigas que nunca me deixaram na mão.
A minha saudade só tem tempo para as lembranças boas. Para as ruas cinematográficas que eu filmei, e para as ruas que eu não consegui filmar. Tenho na minha memória cada pedaço de chão, cada casa, cada varal que eu vi e amei. Amava minha rotina, amava a ideia de ter uma rotina, amava estar estressada com os trabalhos, amava entrega-los e esperar ansiosa pela nota.
Passou rápido demais. Eu fui me apaixonando aos poucos e agora sinto uma dor equivalente ao fim dos romances. Ela doeu-me fisicamente, eu solucei e chorei umas lágrimas tão grossas porque sabia que ali se encerrava um período da minha vida que eu não estava preparada para ver acabar. É uma dor que equivale à da morte: a morte de um período da minha vida, a morte da convivência diária com alguns amigos e amigas.
Não mais subir a ladeira de Santo Antônio, e ver a lua nascer desavisadamente; não mais tirar fotos da minha sombra com a sombra da árvore; não mais pegar a chave na portaria e agradecer por estar há meses no quarto sozinha; não mais cozinhar no 1º andar, andando pela residência com pratos, copos, panelas, e fazendo cheirar a tudo com meu tempero cheio de alho e cebola. Não mais ir ao Universário com o Miro comer sandes de frango e cerveja a €0,50 cêntimos. Não mais visitar o Joaquim, não mais tomar café com o Ricardo, não mais sair com as meninas do Brasil, não mais fumar cigarro com a Sónia. Não mais tantas coisas. Acabou. É tão simples e tão cruel. Eu sei que vou sentir tanta saudade, que não preciso espera-la chegar para sentir que ela já chegou.
Meus olhos estão ardendo. Meu coração está diminuído. Covilhã, obrigada por ter-me feito tão feliz.
Lisboa, 2 de Julho de 2011.
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